quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Recorte do tempo. André Fachetti


Quando uma pessoa se propõe a fotografar, ela quer registrar aquilo que traduz um momento, um detalhe que seja a representação de um sentimento ou fazer correr na imagem a vida e uma história. Esse é o meu pensamento sobre a fotografia.
Dizem que a fotografia é um recorte do tempo. Isso é maluco, mas concordo com a premissa. Por mais que você tente recriar, reviver aquele momento, ele não vai existir nunca mais, está preso ali, original, simples e único.
Ao ver o trabalho de André Fachetti, você percebe que os recortes são feitos com cuidado, perspicácia e extrema singularidade.




"- Bem...vejamos por onde começar... ficha técnica, serve? 1, 2, 3...testando, som...

André Fachetti Lustosa, 33 anos, um cachoeirense que gosta dessa terra sabe-se lá
porque; filho da D.Regina e do Seu Magno, casado e realizado com a Nívia.

O que eu sou?

Tenho aprendido a duras penas que eu não "sou" advogado e professor
universitário. Isso eu "estou", com muito orgulho - e com paixão.

Quanto a ser...ser é diferente. "Ser" é muito mais... Então, pra dizer o que eu "sou"
ainda vai demorar um tempo, pra eu mesmo descobrir por inteiro. Por hora, posso
dizer que sou o cara que sorri com a boca, com os olhos e com o coração.

E a fotografia...a fotografia tem me ajudado a sorrir e a fazer os outros sorrirem.

Tenho iniciado a venda de minhas imagens no que se convencionou chamar de
padrão Fotografia FineArt, ou seja: imagens de alto desempenho estético, para
decoração, registros em museus, salões, bibliotecas, exposições, galerias, com
impressão em jato de tinta adequadas para ressaltar as qualidades da imagem,
buscando papéis próprios e de qualidade máxima (preferencialmente os "fibras de
algodão", importados) e montagem visando à maior durabilidade (qualidade museu,
com materiais de PH neutro).

E aí, o que temos no cardápio desse Café?

Encontro e Café: O que é a fotografia e fotografar para você?

Eu sempre fui apaixonado por ler e escrever. Aprendi a ler as histórias dos outros
e comecei a contar as minhas próprias histórias nas redações, nos poemas, nas
crônicas, nas conversas fartas. Minhas atuais profissões – advogado e professor
universitário – são o exercício da arte de narrar, de buscar as personagens e seus
detalhes, de mostrar um outro mundo, ou o outro lado de um mesmo mundo para
as pessoas... E aí, mesclar sentimento, experiências, realidades particulares ou
coletivas com a técnica própria para que isso alcance o efeito necessário.

É nisso que a fotografia, para mim, se encaixa: eu estou aprendendo a mudar de
formato na hora de ler histórias e na hora de contar histórias. A fotografia tem sido
minha outra forma de expressão, minha nova forma de narrativa.

No fim, não se trata "apenas" de conseguir uma imagem bela. Se eu conseguir isso,
já é ótimo, mas o climax é conseguir lhe contar uma história, seja minha, seja de
outras pessoas, seja uma "história da História"; algumas vezes com mais alegria,
outras com mais crueza da realidade...

O ato de fotografar, de fazer o "clique", em si, é um instante que reúne o prazer,
a realização, a percepção de que a história está ocorrendo e eu tenho que saber
apreendê-la – mas traz todo o repertório de técnica sem o qual simplesmente não se
consegue transmitir uma mensagem.

Porque fotografar, para quem gosta mesmo, não é só apertar o botãozinho do
obturador.

E claro que tudo isso é fruto das minhas experiências anteriores, da minha criação,
da minha história individual. Outros fotógrafos, profissionais ou não, terão sua
maneira de caracterizar a fotografia e o ato fotográfico. Para mim, são narrativas,
num formato de luz.


EeC: Quando você está fotografando, você pensa no que o observador
vai sentir ao ver aquele momento registrado por você?

Delicado isso, hein? A linha entre fazer para transmitir uma mensagem ao outro e
fazer simplesmente para "arrancar elogios" ou "agradar" o outro é tênue. Essa última
não é minha intenção.

Eu diria que não faço para "agradar" o observador, não faço simplesmente
para tornar as coisas "fáceis" para ele (às vezes, temos mesmo que fazer para
incomodar). Mas é claro que eu tento transmitir a mensagem para alguém, e assim,
tenho que aprender a olhar não só com os meus olhos, mas também com os olhos
de quem vai me "ler".

Como isso vai ser visto, sentido, não dá para imaginar. Eu mesmo adoro certas
imagens que, para minha própria esposa, que às vezes estava ao meu lado na
hora da foto, não dizem muito; outras fotos eu acho boas e só, enquanto para meus
amigos, para outros fotógrafos, para compradores das minhas imagens, são grandes
fotos.

É interessante essa pergunta, porque me leva a lembrar de várias lições que já tive
sobre a arte da fotografia, e que se encaixam bem nesse momento:

O fotógrafo não apenas "retrata a realidade", ou "eterniza um momento fugaz".
Quando fotografa, o fotógrafo faz um corte na cena – o que você vê no quadro
clicado é parte de um cenário muito maior, um contexto onde o fotógrafo foi
trabalhando por inclusão (permitindo enquadrar certos elementos) e por exclusão
(de modo que certas coisas fiquem fora da imagem final).



É nesse espacinho que ele vai construir a sua narrativa – que pode retratar a
realidade ou até mesmo falseá-la, transmudá-la. Cabe a ele saber colocar mais
ou menos elementos para atingir seus objetivos. Igual a um texto, com mais ou
menos palavras – mas que vai bater no coração do outro segundo as experiências
particulares de cada um.

Já parou para pensar quantas histórias a foto "Menino com Parelha de Bois"* conta?
Já pensou quantas leituras podem surgir? Já pensou como essa "história" interaje
com as suas experiências? E nas experiências do outro, como isso funciona?

* "Menino com Parelha de Bois" foi finalista do Concurso Internacional de Fotografia Documental "Los Trabajos y Los Dias", em Medellin, Colombia-2011. A foto é de 2010, realizada em Venda Nova do Imigrante-ES.

EeC: Ao ver suas fotografias, percebo que elas estão carregadas de detalhes
muito profundos e ricos, como o olhar do homem na fotografia “Folia de um
Rei”, ou o menino com o carro de boi ("Menino com Parelha de Bois"). Quando
fotografa, como você vê que deve registrar esses detalhes?

Não vou mentir: às vezes, aparece na cena uma aura que a gente não imaginava,
uma beleza que a gente não viu no visor na hora da foto.



Mas a fotografia é consciência; portanto, sim: quando aparece um sorriso altamente
simbólico, eu desejei captá-lo. Quando o olhar do menino atinge o meu espectador,
eu desejei aquele olhar; com as minhas experiências, com a minha leitura particular,
mas eu o desejei. Assim também com as paisagens, com as formas e linhas
abstratas... Os "detalhes", então, podem ser o ponto central da fotografia ou um
elemento que coopera para o todo, depende da cena, do ambiente, até do meu
estado de espírito.



Um dos monstros sagrados da fotografia mundial, o francês Henry Cartier-
Bresson (1908-2004 - http://www.henricartierbresson.org), desenvolvedor do
fotojornalismo, cunhou a expressão "instante decisivo" ou "momento decisivo". No
começo, eu achava que isso era um momento mágico, como se a Lua, Terra, Sol e
Marte entrassem em conjunção astral e ...tchan! A foto mágica surgisse. Tolice:

Com o tempo – praticando e estudando – o próprio termo de Bresson foi se
explicando. Na verdade, agora vejo (e assim também muitos estudiosos descrevem)
que esse momento especial é "pré"reconhecido pelo fotógrafo, com o passar do
tempo, a prática, a experiência: pode ser uma questão de segundos, ou de horas,
mas o bom fotógrafo sabe que a cena vai ser montada na frente dele, sabe que a
criança vai correr, o ancião vai sorrir, a fumaça vai subir na hora e no local certo – e
a gente precisa esperar, antever, pois esse é o "instante decisivo", que vai capturar o
detalhe que importa na narrativa visual.

EeC: O que significa registrar o cotidiano de um determinado lugar para você?

Primeiro, a insegurança, o medo, o frio na barriga de ser capaz ou não de encontrar
a essência – ou "uma" essência. Depois, um sentimento de gratidão a Deus, por
me permitir a experiência única de fotografar; gratidão às pessoas que construíram
o local, construíram a magia do local; às pessoas que me permitem encará-las por
detrás de uma objetiva, entrando em seus segredos... alguns povos ainda acreditam
que a câmera fotográfica lhes toma a alma, certo?



Não quero aprisionar nenhuma alma, juro. Mas se eu puder levá-las para passear lá
em casa...

EeC: No Brasil, é comum falar-se mas incomum de se ver os famosos
fotoclubes. Como é para você participar de um? O que busca registrar nos
encontros e como vê o trabalho do fotoclube que participa, no Estado?

"Comum e incomum" foi boa... eu diria que fotoclubes e outros grupos que reúnem
fotógrafos pelo prazer de fotografar são igual OVNI´s: todo mundo já viu um, menos
a gente mesmo.

Eu participo do Grupo Cliques – Grupo de Fotografia Capixaba
(www.grupocliques.com.br) que tem "sede" em Vitória (a maior parte dos integrantes
é de lá), mas conta com pessoas de quase todo o Estado, e se propõem a, uma
vez por mês, visitar uma cidade do Espírito Santo para conhecer e registrar, além
da partilha diária que fazemos sobre fotografia por email (lista de discussão). É
espetacular ver colegas com celular, câmeras compactas, reflex profissionais e
toda a sorte de equipamentos – incluindo as famosas gambiarras – fotografando. Já
fomos matéria do Programa Em Movimento da TV Gazeta.

A tendência é que os grupos de fotógrafos ganhem mais visibilidade a cada dia.
A facilidade da realização da fotografia hoje (pegue o seu celular e ele tem uma
camera, sem dúvida nenhuma), com a integração das pessoas de interesses
semelhantes pela internet...tudo isso vai popularizar esses clubes, grupos.

Há pouco tempo, a imagem era de velhinhos que se reuniam com centenas de
negativos e câmeras ultrapassadas dentro de uma sala sombria. Não! Nunca foi isso
e, hoje, a imagem é ainda mais solar.

Por isso, não se pode esquecer: fotografia se faz saindo do sofá, levantando detrás
do computador e colocando o pé na estrada. Grupos de internet, orkut, FB, Twitter,
podem ser o começo. Mas fotografia é sol na cabeça, pé no chão, diálogo, amizade,
partilha (isso é o ponto alto dos fotoclubes), acertos e erros, fotos boas e muitas,
muitas fotos ruins pra aprender.

EeC: Quando é o momento certo para dar o clique?

E existe um? Do ponto de vista do "dedo nervoso" (a gente chama assim o povo
que dispara igual a uma metralhadora...), não se pode perder nem uma virada de
cabeça, nem uma mão no ar, nenhum voo, nenhum detalhe. Para outros mais
céticos, cada disparo tem que gerar uma foto perfeita, na fotometria, no foco, na
disposição dos elementos...


Não sou de nenhum desses dois grupos extremistas: a foto se constrói, assim como
se constrói uma redação, ou essas perguntas que vocês está me fazendo... nada
impede que depois de uma frase, você pense e faça melhor. Nada impede que
depois de um clique na horizontal você perceba que a imagem pede um clique na
vertical. Com o tempo, isso fica mais instintivo.

EeC: Quando você está em viagem, os registros são muito ricos, como as
luzes, detalhes muitas vezes que passam despercebidos quando são vistos
ao vivo. Você se doa para achar a expressão máxima do lugar, e conseguimos
sentir o seu encantamento por estar ali. Como é isto para você?

Primeiro, obrigado pela leitura que você fez. Uma grande alegria é exatamente ouvir
as pessoas dizerem: "- Mas eu nunca vi isso ali!", ou "- Isso que é simples ficou lindo
na sua imagem".

E uma das coisas que eu digo é, simplesmente: "-Obrigado por me permitir enxergar
certas coisas por você".



No fim, tudo se resume em contar histórias, viu? Retratar um lugar – e "o lugar" não
interessa: pode ser a margem do Rio Itapemirim, pode ser Paris às margens do Rio
Sena – é, obrigatoriamente, fazer parte dessa história.

Nos lugares, sejam viagens, andanças, shows, reuniões sociais, mesmo dentro
do estúdio, você tem que querer fazer parte daquilo. É engraçado, porque eu, que
estou apenas no começo, ainda consigo sentir e perceber o impacto dos primeiros
minutos de reconhecimento do espaço, das pessoas, do clima, para só então me

sentir à vontade para os registros. Às vezes, são horas. Quando estive em Paris, no
começo de 2011, achei que aquele lugar fosse me engolir! Então, demorei mais pra
me sentir integrado. Em breve vou postar um texto que chamei de "Paris: a cidade
que nos engole".

Com o tempo, os mais experientes já fazem a leitura imediata das circunstâncias.
Mas para mim, sempre será uma experiência de absoluta imersão.

EeC: Como você se sente quando vê seu trabalho sendo reconhecido de
alguma forma?

Os mais ácidos costumam brincar com o ego dos fotógrafos. Chega a ser maior do
que o dos advogados!

Brincadeira à parte, ser reconhecido não é receber elogios, parabéns e coisas que
os valha. Não esnobo um elogio, óbvio. Faz bem, é gostoso e importante.

Mas "ser reconhecido" é o melhor: ver que alguém olhou grande parte do seu
material, percebeu a alma do fotógrafo ali, encontrou a si mesmo nos meus olhares.

Comprar minhas imagens é parte de um movimento, uma consequência. Eu quero
que as minhas imagens estejam nas casas, nos museus, nos salões, nas revistas,
internet, mas eu quero que elas representem a minha forma de expressão. É um
grito que eu quero que seja reverberado, e não se trata de prender minhas imagens
em molduras bonitas, impressas em papéis que vão durar 150 anos..

Eu quero ( todos nós queremos) poder ser ouvido. Escrevendo com a luz.

Ser reconhecido é poder responder a uma entrevista assim, tranquilo e com sorriso
no canto da boca, porque as minhas histórias visuais mexeram com as histórias da
Taynara Barreto. E espero que mexam com os leitores do Encontro e Café.

Valeu!




segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Chico está Lindo!

Bem, esse post não pode ser considerado, leia como uma fã fala de seu ídolo.

Não tenho moral pra falar do cara, porque ele é O CARA.
Quem? Chico Buarque de Holanda.

Tudo que eu falar aqui será nada diante do talento incondicional e que todo mundo, mesmo quem não gosta, reconhece.

Vamos parar de enrolar então...
Tô aqui pra falar, em tom particular, do novo cd CHICO.
Quando um artista lança um material, os críticos sempre falam em: "Fulano está amadurecendo a cada trabalho."
Se fosse possível dizer isso a respeito de Chico Buarque, diria que ele está em sua fase mais metódica e romântica. Mas, novamente, não é possível dizer que Chico amadureceu porque ele é completo.

Mas de fato o cd novo está carregado de uma melodia lenta, tranquila, que faz o pensamento viajar no amor e na pessoa amada.

A música "Sem você" traduz tudo isso, um piano doce ao fundo, um dedilhado suave ao violão e a doce voz sobrevoando na melodia que se perde nos ouvidos e vai pro coração. E quando digo isso, não é mentira.

O CD, não está como o antigo Chico, dos sambas para o sábado e aquela alegria de sol. Ele está intimista, luz baixa e vinho. Falando baixinho e ecoando em versos simples de um cotidiano perto.

Os duetos, completam o que a canção quer dizer. Limpos, aveludados e lindos.
Chico está lindo.

Download: AQUI!

Bom Café!


sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Sim... Era você!


Precisava daqueles momentos, e naquele instante foi tudo que pude fazer. Era madrugada. Inquieto no quarto, cheguei a cogitar a possibilidade de te ligar... ouvir a sua voz me aqueceria.
Não tinha sua voz, não tinha coragem de buscar sua voz, algo em vão não era o que precisava naquele momento. Coloquei um casaco, um maço de cigarros no bolso e saí. O vento noturno do mês de julho, meu pensamento voltou logo para aqueles anos. Passado. Precisava de algo real. Presente.
Andei sem destino sabendo que não chegaria a lugar nenhum, quando me deparei com ela. Passou por mim como se não tivesse percebido minha presença.
Um perfume me invadiu, fui atrás dela, mas já não sabia onde tinha ido. A porta aberta me convidou para uma bebida. Um conhaque, por favor.., enquanto o cigarro ia queimando nos meus dedos me dei conta de que o tempo tinha passado. Outro conhaque. Agora o frio já não era tão cortante.
Era chegada a hora de voltar para casa, as pernas estremecidas, ora por frio, ora por nervosismo, ora por efeito do álcool (que nessa hora já passava do sexto copo). Eis que ao fechar os olhos e uma rápida passada de mãos pelos cabelos, o mesmo perfume invade o bar. Por todos os cantos procuro... a porta se fecha.
Saio meio cambaleando, procurando a direção. Nada.
Eu que procurava algo real, terminava a noite com mais uma ilusão e um perfume inconfundível que dilacera meu coração.
Sim... era você!


Por Lemisson

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Um pouco fresca, talvez.


  Quando eu nasci, o meu anjo da guarda professou a seguinte frase: Ela será fresca!
Só pode ter sido isso que aconteceu. Se bem que não sou fresca ao extremo, pois muitas coisas eu tolero bem. E foi usando esse meu lado “não fresco” e a minha enorme curiosidade que eu, minha irmã e algumas amigas marcamos de ir a um restaurante de comida japonesa. Tava na cara que isso não ia dar certo, mas é sempre tão bonito ver, na televisão, as pessoas indo aos restaurantes
japoneses e comendo de rachi!   

  No dia combinado, ao chegarmos lá, eu logo pensei: “Hum... Isso aqui tem cheiro de peixaria extremamente limpa...” O ambiente é bem interessante, com lustres, mesas, garçons a caráter e coisa e tal, mas o que me deixou realmente incomodada foi a luz, ou melhor: a falta dela. Aquilo lá tá mais pra penumbra. Fiquei bastante constrangida, pois o clima estava mais pra casalzinho apaixonado e nós estávamos desacompanhadas. Assim que o momento sem graça passou, eu fiquei foi com medo. O que será que essa falta de luz estava tentando esconder? Enquanto me livrava desse pensamento, nos acomodamos.

  O sushiman trouxe o cardápio e, quando olhei aquele monte de nomes, minha vontade foi de
perguntar: tem com legenda em português? Nossa sorte foi a minha experiente irmã mais nova, que morou por dois anos em São Paulo e visitou vários desses restaurantes. Pedido feito e uma ansiedade quase palpável.

  Uma coisa não dá pra negar: nem em fast food a comida fica pronta tão rápido. Também, eles não usam fogo... Entre fotos, conversas, risos e treinamento para aprendermos usar o rachi, levanto
os olhos e vejo o sushiman vindo com um barquinho na mão. Como assim? Nós vamos comer ou fazer uma oferenda pra Iemanjá? Barquinho na mesa e eu, no auge da minha habilidade de comer
com “pauzinhos” ­ adquirida em cinco minutos de treinamento intensivo, pego um rolinho de arroz colado, envolvido num troço verde e com um pedaço de “não sei o que” no meio, passo pelo doce e
cremoso molho shoyo e corajosamente o levo à boca. Não foi tão difícil de engolir, já que tomei um bom gole de coca­cola em seguida.

  Não deu tempo de o meu paladar definir o que sentiu, porque foi um momento muito rápido.
O pior desse momento foi olhar pros lados e ver como as pessoas comem isso com uma boca tão boa. Pra não perder o hábito, pensei: “Acho que sou um ET!”
Pra acabar de vez com essa má impressão, decidi comer o tão famoso sashimi, muito
conhecido também como peixe cru. Metida que sou, fui logo no salmão, o mais caro, o cor ­ de­ rosa. Só não sei por que escolhi esse; logo eu, que sempre odiei rosa. Deve ser porque não havia um peixe azul. Sem perder a pose, pego um generoso pedaço de peixe, molho no shoyo e levo à boca. Acho que nada do que eu disser/escrever daqui pra frente vai conseguir ser fiel àquilo que senti. Foi uma mistura de nojo, pânico, medo, desespero, vergonha e sei lá mais o quê. Só consigo imaginar uma maneira de explicar a sensação que tive. Sabe baiacu, aquele peixe que quando está em perigo vai inflando, inflando e finge de morto pra escapar? Pois é! Foi um desespero ter a certeza de que isso era o que estava acontecendo dentro da minha boca.

  O pânico aumentou a níveis inimagináveis quando percebi minha amiga tentando deixar esse momento humilhante da minha vida registrado nos vídeos do seu celular. É melhor mesmo que tenha
apenas registros de memória, e, se Deus quiser, daqui uns anos, a falta dela.
Não dava pra engolir o “baiacu gigante” que estava na minha boca! Num ato de pura sobrevivência, peguei um guardanapo e literalmente cuspi o danado. Alívio total! Tanto pra mim, quanto pro peixe. Tenho certeza de que foi o pior dia de nossas vidas. Minha vontade naquela hora era de chamar o sushiman e perguntar: “Já ouviu falar em picanha bem passada?”

  Agora já sei o que responder quando me convidarem para ir num restaurante japonês: “Não,
obrigada, prefiro um tratamento de canal.” Aproveito pra deixar registrada minha admiração por aqueles que gostam da culinária japonesa. Parabéns pela coragem e pelo estômago de avestruz! Porém, serei eternamente grata aos nossos antepassados, os homens das cavernas. A eles, toda minha gratidão e todo meu respeito. Penso em, futuramente, tatuar em mim a seguinte frase: “Obrigada, Senhor, pela descoberta do fogo!”

Por Kelly Elizeu