terça-feira, 13 de setembro de 2011

Um pouco fresca, talvez.


  Quando eu nasci, o meu anjo da guarda professou a seguinte frase: Ela será fresca!
Só pode ter sido isso que aconteceu. Se bem que não sou fresca ao extremo, pois muitas coisas eu tolero bem. E foi usando esse meu lado “não fresco” e a minha enorme curiosidade que eu, minha irmã e algumas amigas marcamos de ir a um restaurante de comida japonesa. Tava na cara que isso não ia dar certo, mas é sempre tão bonito ver, na televisão, as pessoas indo aos restaurantes
japoneses e comendo de rachi!   

  No dia combinado, ao chegarmos lá, eu logo pensei: “Hum... Isso aqui tem cheiro de peixaria extremamente limpa...” O ambiente é bem interessante, com lustres, mesas, garçons a caráter e coisa e tal, mas o que me deixou realmente incomodada foi a luz, ou melhor: a falta dela. Aquilo lá tá mais pra penumbra. Fiquei bastante constrangida, pois o clima estava mais pra casalzinho apaixonado e nós estávamos desacompanhadas. Assim que o momento sem graça passou, eu fiquei foi com medo. O que será que essa falta de luz estava tentando esconder? Enquanto me livrava desse pensamento, nos acomodamos.

  O sushiman trouxe o cardápio e, quando olhei aquele monte de nomes, minha vontade foi de
perguntar: tem com legenda em português? Nossa sorte foi a minha experiente irmã mais nova, que morou por dois anos em São Paulo e visitou vários desses restaurantes. Pedido feito e uma ansiedade quase palpável.

  Uma coisa não dá pra negar: nem em fast food a comida fica pronta tão rápido. Também, eles não usam fogo... Entre fotos, conversas, risos e treinamento para aprendermos usar o rachi, levanto
os olhos e vejo o sushiman vindo com um barquinho na mão. Como assim? Nós vamos comer ou fazer uma oferenda pra Iemanjá? Barquinho na mesa e eu, no auge da minha habilidade de comer
com “pauzinhos” ­ adquirida em cinco minutos de treinamento intensivo, pego um rolinho de arroz colado, envolvido num troço verde e com um pedaço de “não sei o que” no meio, passo pelo doce e
cremoso molho shoyo e corajosamente o levo à boca. Não foi tão difícil de engolir, já que tomei um bom gole de coca­cola em seguida.

  Não deu tempo de o meu paladar definir o que sentiu, porque foi um momento muito rápido.
O pior desse momento foi olhar pros lados e ver como as pessoas comem isso com uma boca tão boa. Pra não perder o hábito, pensei: “Acho que sou um ET!”
Pra acabar de vez com essa má impressão, decidi comer o tão famoso sashimi, muito
conhecido também como peixe cru. Metida que sou, fui logo no salmão, o mais caro, o cor ­ de­ rosa. Só não sei por que escolhi esse; logo eu, que sempre odiei rosa. Deve ser porque não havia um peixe azul. Sem perder a pose, pego um generoso pedaço de peixe, molho no shoyo e levo à boca. Acho que nada do que eu disser/escrever daqui pra frente vai conseguir ser fiel àquilo que senti. Foi uma mistura de nojo, pânico, medo, desespero, vergonha e sei lá mais o quê. Só consigo imaginar uma maneira de explicar a sensação que tive. Sabe baiacu, aquele peixe que quando está em perigo vai inflando, inflando e finge de morto pra escapar? Pois é! Foi um desespero ter a certeza de que isso era o que estava acontecendo dentro da minha boca.

  O pânico aumentou a níveis inimagináveis quando percebi minha amiga tentando deixar esse momento humilhante da minha vida registrado nos vídeos do seu celular. É melhor mesmo que tenha
apenas registros de memória, e, se Deus quiser, daqui uns anos, a falta dela.
Não dava pra engolir o “baiacu gigante” que estava na minha boca! Num ato de pura sobrevivência, peguei um guardanapo e literalmente cuspi o danado. Alívio total! Tanto pra mim, quanto pro peixe. Tenho certeza de que foi o pior dia de nossas vidas. Minha vontade naquela hora era de chamar o sushiman e perguntar: “Já ouviu falar em picanha bem passada?”

  Agora já sei o que responder quando me convidarem para ir num restaurante japonês: “Não,
obrigada, prefiro um tratamento de canal.” Aproveito pra deixar registrada minha admiração por aqueles que gostam da culinária japonesa. Parabéns pela coragem e pelo estômago de avestruz! Porém, serei eternamente grata aos nossos antepassados, os homens das cavernas. A eles, toda minha gratidão e todo meu respeito. Penso em, futuramente, tatuar em mim a seguinte frase: “Obrigada, Senhor, pela descoberta do fogo!”

Por Kelly Elizeu

4 comentários:

  1. apesar do trauma, esse dia foi muito divertido!

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  2. e eu achando que isso era coisa da sua cabeça. AHSISHIHDIAS

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  3. Excelente texto! Passei por uma experiência exatamente igual. Eu e minha namorada, pedimos a essa tal barca, veio todo bonita e pomposa. Experimentei ( ou pelo menos tentei experimentar ), dois pedaços. Primeiro comi um sem o molho, não gostei. Depois pensei: po, esse molho não está aqui a toa. Peguei um pedação de salmão, dei a molhada e coloquei na boca. No que eu coloquei eu não consegui mais mexer minha boca, não mastigava nem engolia nem nada. A textura daquilo dentro da minha boca só mandava a seguinte mensagem para o cérebro: cospe, cospe, cospe!!! Não deu outra, fiz igual a você, peguei um guardanapo e cospi fora. Naquele momento olhei pra minha namorada e ela também não tinha gostado nada dessa experiência. Naquele momento eu pedi a conta, e adivinhe pra onde fomos logo quando saimos dali? Direto pra uma churrascaria. E detalhe: na churrascaria eu gastei 3 vezes menos do que a tal barca. Picanha rulez! hahaha...

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